Häresie / Nächtlich (Livor Mortis, 2020)

Editado em 2020, este Split é dos melhores trabalhos que tive oportunidade de ouvir no referido ano. Esta dupla tem vindo, ao longo dos recentes anos, a mostrar-se sobremaneira capaz de criar um som que prima pelo esforço de ser diferente. O tentar ser diferente já é mais do que posso dizer de muitos outros projectos que povoam o Black Metal actual. Por vezes questiono-me até quando será possível "explorar" o filão…

Häresie é a entidade que abre este Split. "Kulde" é uma forma soberba de dar início a um álbum. O ritmo, nada dado a velocidades estonteantes ou violências absurdas, acaba por nos levar, embalando-nos na sua doce negritude. Cada um dos projectos apresenta 3 temas, e cada um destes 3 temas é uma mostra de diferença, da parte de Häresie. Lento e cadente; majestoso e delicado; o recurso às teclas, um pequeno solo de guitarra, as vocalizações "enterradas" debaixo dos instrumentos, mas ainda assim perfeitamente audível. Escrevi, numa review que tive oportunidade de elaborar para a VM-Underground, que todo este movimento mais recente – por mais que muito neguem que exista um movimento mais "cavernoso e cru" dentro do género – me assustava um pouco. Assusta-me saber que, de repente, esta sonoridade mais despida de artifícios e exageros, se tornou a "next big thing". Mentira? Não sei… Mas de regresso: Häresie vem mostrar, pelo menos neste lançamento, que prima, sim senhor, pela diferença! Há uma noção de onde longe levar a produção, as guitarras, tudo… 3 dos melhores temas que ouvi em 2020.

De seguida temos mais uma oferta da parte dos canadianos Nächtlich: excelente Raw Black Metal desde o primeiro dia em que decidiram gravar ahahah! Sobejamente conhecidos, de certeza que estais bem cientes das capacidades deste duo. U.E. e Gamzhurm, men of many trades. Listo a quantidade de projectos criados / da qual fazem parte estes senhores? Não vale a pena, mas são imensos, e uma larga maioria deles é de altíssima qualidade. O som é áspero e gélido, muito à semelhança do país de origem; como que um tresloucado instante numa vivência, por si só, anormal. Insanas vocalizações que ganham vida com o auxílio do instrumental! Ao contrário dos camaradas de Split, estes são mais "violentos" no modo como expõem o seu som, as suas criações; possuídos por sabe-se lá o quê, o resultado final é distinto, mas igualmente agradável.

Na sua totalidade, este trabalho é uma mostra da capacidade criativa dos músicos que povoam a cena Black Metal internacional. Apesar de ter dado a entender que tenho dúvidas acerca da integridade e validade da mesma, nunca menosprezei os espécimes que se destacam no meio de tanto marasmo e cópia nórdica. E de modo algum retirar o valor àqueles que hasteiam a bandeira do género, mantendo-se fiel ao mesmo. Mas vá, passámos de uma crítica a uma dissertação. Senhores e senhoras, caso não tenham dado já uns minutos da vossa vida a este Split, fazei o favor de dar, que não vos ireis arrepender.



Wømb– "Here, the World Falls…" (Purodium Rekords, 2020)

A postura do Black Metal e a postura do Punk são muito mais similares do que muitos querem ver. Womb não é Punk, Womb é Black Metal. A postura de Womb é um misto de Black Metal primitivo, com (por vezes) a agressividade groove do Punk. O Black Metal acaba por tomar controlo quase total da Música, mas permite que a veia Punk se mostre, aqui e ali. Há aqui uma abordagem bastante crua, directa e simples; sendo que o termo “simples” se refere ao modo straightforward com que o duo “expulsa” o resultado final da criação! Os vocais são soberbos! A intensidade e a brutalidade com que são expelidos, é igualado por muitos poucos, seja em Portugal, seja fora. De certa forma, um comentário acerca deste “Here, the World falls...” não necessita ser muito longo: o Black Metal é primitivo e agressivo q.b., tem uma pesadíssima atmosfera, muito devido à produção, que ajuda a que o som  nos arrasta, com ele, para o fundo de uma qualquer caverna repleta de enxofre. Os riffs são “enormes”, caramba! “Great Mother of Destruction, Time and Death” apresenta-nos, logo de início, a capacidade compositora de WOMB, onde a agressividade e a melodia se unem, criando uma besta demolidora. Será este uma das pérolas ignoradas da cena Black Metal nacional? Bem, arrisco dizer que não, mas um pouco mais de visibilidade (que não implique sair da caverna) seria mais que merecida!


Wampyric Rites – “Demo III” (Death Kvlt Productions, 2020)

Há uma série de anos que temos vindo a admirar como o Black Metal, como género musical, tem-se tornado – de novo – primitivo. Em paralelo com este retorno às origens, temos visto um percurso inverso no que toca à sua popularidade nos meios de comunicação, as labels, os próprios fãs… esta “onda” mais primitiva conquistou fãs atrás de fãs, que procuram este som muito característico, necro e efectivamente bastante cru; os outros, aqueles que olham para este género, ou pelo menos para esta vaga mais “raw”, como a next big thing. É realmente, muito triste e frustrante, ver onde chegou o género. Melhor, onde chegaram alguns dos seus fãs. Ter a Cassete da banda X, limitada a 66 exemplares (ou 6, como já vi), é totalmente absurdo. “I am not worthy”, já gritava o outro. Quiçá, quem sabe, não é este o pensamento de muitos. Se assim for, mais triste se torna. Mas triste porquê?! Sou apologista que, como quase tudo na vida, a interdição de acesso, é ilógico. Viveu-se nos 90, como a Team Norway a enviar cartas ao música A ou B, com ameaças de morte, por estes não tocarem Black Metal e coisa e tal. Parvoeira de garotos, que hoje veio replicada por adultos. Mas isto é algo que não se consegue batalhar, especialmente quando temos músicos que alimentam esta maneira de ver a Música. Que o Black Metal é um género especial, concordo plenamente. Mais que Música, na minha opinião. Mas, com essa ideia em mente, devo / posso impedir que todos aqueles que são fãs do mesmo, se cultivem um pouco mais?! Fica a questão.

Mas, não estamos aqui hoje para avaliar a postura dos fãs/labels/promotores/músicos, mas sim para falar de Música. Wampyric Rites, do Equador. Lançaram, não há muito tempo – 1 de Abril de 2020, para ser mais preciso – o seu penúltimo trabalho. O dia 3 de Abril viu o lançamento da última demo (“Spectral Castle”), a qual ainda não me foi possível ouvir. Fazendo um apanhado do som da referida banda: é Raw, mas pleno em melodia. Engraçada característica prende-se com a geografia da banda. O facto de ser Sul-americana, como que passa, para o som da mesma, uma tonalidade que não vemos em muitas. Esta Demo, em concreto, tem momentos cadentes e lentos que aportam imenso à fluidez e dinâmica das músicas. Não deixa de viver na esfera do Black Metal mais primitivo, não, mas o recurso a teclados – ou a temática não fosse mais Vampiresca – torna as composições muitíssimo mais envolventes e ricas. Não há, felizmente, uma linha básica e quase monocórdica, em que a música mantém a mesma cadência de início a fim. Não. De referir que o senhor por trás das teclas criou um outro projecto que, esse sim, vive quase exclusivamente – se não por completo – de teclas: Lord Einsamkeit. Dungeon Synth no seu melhor. Outro género que viu a sua popularidade crescer aquando deste “retrocesso” musical da parte do Black Metal. Eu, pessoalmente, agradeço, visto ser uma outra realidade musical que me agrada imenso. RPGs e Vampiros?! Oh yes, please! Inegável o quanto a banda cresceu com a adição das teclas.Toda uma atmosfera cada vez mais bela e negra, em simultâneo, que tem vindo a crescer, também, em termos de notoriedade (se no Black Metal tal avaliação pode ser feita). A produção é limpa q.b., permitindo que se entenda cada momento de cada um dos temas. As vocalizações são agonizantes e deprimentes, como se exige! Estes Wampyric Rites são a prova que o género não morreu, que este retrocesso pode ser feito com brilhantismo, e que o recurso o teclado nunca foi o parente pobre do Black Metal! Brilhantemente Negro e Vampiricamente Necro!



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