O Preconceito Musical ou a Máscara dos Guilty Pleasures?

Vivemos numa altura em que, pelo que leio e vejo, ter um guilty pleasure é hip, é chique e é o raio. Sempre que me perguntam “qual o teu guilty pleasure?” fico na retranca. Estarão a perguntar o quê, afinal? Algo que ouço mas tenho vergonha de assumir? E aí está o cerne da coisa: não recordo ouvir algo de que me envergonhe. Sim, mesmo. Verdade seja dita, mesmo naqueles que seriam guilty pleasure sou extremamente picky e sectarista (LOL). Hits de Verão? Não, sff. E não por quê? É pá… porque não. Não sou de consumir singles, só para dar início à discussão. Faz-me imensa confusão pessoal que não é capaz de ouvir um álbum, ou que não se dá ao trabalho de tal – o que existe, claro. Justificação? Vivemos num Mundo/mundo tão disposable, que nos bastam os singles que passam na rádio. Só isso explica um músico como o Ed Sheeran lançar 35456547860 singles por álbum, mas… os Metallica fizeram o mesmo, os QOTSA igual, se não estou em erro, portanto o que os faz diferentes dos primeiros? O eu apreciar a música deles? Isso seria seriamente arrogante, não? Errr… sim.

Haverão músicos que olham para a Música assim, desse modo, da perspectiva dos singles? Não sei, desconheço se há, mas nem quero saber. Não vivo a música assim, portanto não quero perspectivá-la assim. Mas de onde vem isto? De onde surgiu esta ideia, esta necessidade de regurgitar palavras e ideias? Num Mundo/mundo que cria tanta Música, de tantas cores e feitios, é humanamente impossível estar em “cima do acontecimento”, a par de tudo aquilo que é editado, o que leva a que nos escape muita e boa Música. Depois há, claro, aquela Música a que nunca iremos dar atenção, por prconceito (aaah, palavra dolorosa, pá). Sim, preconceito. Mas preconceito do quê, perguntas tu? Exemplo: pessoal do Heavy Metal, aquele mais velho, que viveu os 80 e ostentou um soberbo – not – mullet, dificilmente olha para a Música do mesmo modo que um cachopo de 20. Por…? Por várias razões: continua, em muitos dos casos, a viver – mentalmente – nos 80, a ouvir a mesma Música, ou artistas actuais que emulam esse mesmo som, não conseguiu criar um “campo de absorção” grande o bastante para absorver mais influências, em muitos casos não consegue vislumbrar que há qualidade para lá dos limites que ele impõs a si próprio. Isto, compreendo, soará também um pouco preconceituoso. Ou seja, quem sou eu para pintar este quadro? Ninguém, confere. Mas já o vivenciei? Ui… demasiadas vezes. Mas, de certo modo, consigo aceitar que me digam que os nossos gostos crescem connosco e com as nossas vivências, porque assim o é.

Mas isto parte de uma caso concreto que me põs a ponderar até que ponto eu era, ou não, também um pouco preconceituoso a nível musical. A Música portuguesa é, em todas as suas linhas musicais, em todas as suas realidades sonoras, soberba. De um género para outro, passando por 2564658589 outros, há qualidade a rodos, como se diz. Eu, que até me considero bastante eclético e não portador dos tais guilty pleasures, decidi dar uma hipótese a um projecto nacional que andei anos e anos a evitar, e ainda hoje não percebo a razão para tal: PAUS. No mundo do Heavy Metal acabamos por ir atrás dos músicos que nos agradam sempre que estes criam um novo projecto ou uma nova banda, em muito porque sabemos que é qualidade garantida. Agora, por que razão não aconteceu aqui o mesmo, é algo que desconheço. The Vicious Five, Riding Pânico e If Lucy Fell, 3 dos projectos/bandas nacionais que mais aprecio e que mais qualidade têm/tinham/já nem sei bem. Fábio Jevelim, Hélio Morais, Joaquim Albergaria e Makoto Yagyu. Raios nos gajos! Do Post/Hardcore/Screamo Something dos If Lucy Fell, ao Rock n’ Roll classy, energético e a flirt com o Punk, sempre elegante, dos The Vicious Five, ao Post/Rock Instrumental dos Riding Pânico, este trio de bandas, com as suas criações passadas, “ocuparam” horas e horas dos meus dias. Do antigo Hard Club ao Palco 25 de Abril, da cave da Escola Superior de Bragança ao Bar Central, também ele em Bragança, cada um destes concertos trouxe um pouco mais de admiração pela obra destes 4 músicos.

Agora, a razão para ter chegado tão tarde “à festa”, creio que nunca a saberei. E daqui, como já dito, nasceu a ideia do preconceito musical. Estaria a fugir da ideia pré-concebida, por mim, do som dos mesmos? Isso era absurdo, digo eu. Mas quiçá… isto a Música funcionará como aquela sensação de “não te conheço mas não gosto de ti”? se calhar não anda muito longe de tal. E, se pensarmos assim, muita boa Música nos passará ao lado, como foi este caso. Dei por mim a correr grande parte da discografia de PAUS, com gosto, a descobrr pormenores que nunca imaginei vir a gostar. É engraçado ver como uma pessoa cresce e se torna mais tolerante as realidades que, em tempos, tomou como “nefastas” ahahah do puto de 15 anos que não aceitava vozes limpas no Black Metal que ouvia, a um puto mais velho que intercala PAUS com Joy Division e Bathory. Isto é, meus senhores, similar a pizza com ananás: uma mixórdia do camandro! Mas esta mixórdia é boa, é dinâmica, e essa diversificação é vida, é energia! A pizza… nem por isso. É ouvir Capicua e acompanhar o refrão, para logo de seguida enveredar numa viagem pelos anos 90 ao som de uma qualquer banda norueguesa adoradora do Capeta. É… estranha viagem esta. Downhill ou algo.

E onde é que estes PAUS, na minha opinião, conseguem conquistar-me? É um som fresco… com já pouco mais de uma década (go, Danny) em que a percurssão é, sem margem para dúvida, a rainha. Duas baterias – hey, Melvins – Hélio e Quim, frente a frente, com pujança e groove, com presença e a marcarem o ritmo que não se desvia um centímetro da meta. Aquele baixo do Sr. Makoto – Cedric Bixler-Zavala da tuga – a preencher os espaços, a criar aquela camada de peso, apoiando-se nas baterias, ou as baterias neste. Acaba por ser um trabalho de colaboração. As teclas, que criam atmosferas delicadas, groovy, escuras, flutuantes, tudo obra de Fábio Jevelim. Por vezes é música para dançar, outras é para voar. Prefiro aquelas que me fazem voar, já que dançar não é a minha cena, babes. Mas não deixa de ser engraçado – ou vergonhoso? – que tenha tardado uma década em dar atenção a um grupo de músicos que tinha, anteriormente, criado tanta música que ainda hoje guardo com carinho, somente por considerar que PAUS nunca seria “my cup of tea”. Triste. Próximo passo? Linda Martini, maybe. De qualquer modo, guilty pleasures are not my thing.

PAUS - "L1232

ENGLISH VERSION:

Musical Prejudice or the Guilty Pleasures Mask?

We live in a time when, from what I read and see, having guilty pleasure is hip, it is chic. Whenever I am asked “what is your guilty pleasure?” I ask myself: what are you asking, anyway? Something I hear but am ashamed to assume? And therein lies the heart of it: I don't remember hearing anything that I'm ashamed of. Yes, really. Truth be told, even in those who would be guilty pleasure I am extremely picky and sectarian (LOL). Summer hits? No, sff. And why not? That's it ... why not.

I'm not a fan of singles, just to start the discussion. It confuses me a lot, people who are not able to listen to an album, or who don't bother with it - which is, of course. Justification? We live in a world / world so available, that singles on the radio are enough. That alone explains a musician like Ed Sheeran to release 35456547860 singles per album, but ... Metallica did the same, QOTSA the same, if I'm not mistaken, so what makes them different from the first ones? Do I enjoy their music? That would be seriously arrogant, wouldn't it? Errr… yes.

Will there be musicians who look at music like that, from the perspective of singles? I don't know, I don't know if there is, but I don't even want to know. I don't live music like that, so I don't want to see it that way. But where does this come from? Where did this idea come from, this need to regurgitate words and ideas? In a World / world that creates so much Music, of so many colors and shapes, it is humanly impossible to be "on top of the event", alongside everything that is edited, which leads to a lot of good Music escaping us.

Then there is, of course, that Music that we will never pay attention to, by concept (aaah, painful word, man). Yes, prejudice. But prejudice of what, you ask? Example: Heavy Metal people, the oldest, who lived in his 80s and sported a superb - not - mullet, hardly looks at Music in the same way as a 20 's cachopo. Why ...? For several reasons: in many cases, continues to live - mentally - in the 80's, listening to the same Music, or current artists who emulate that same sound, it was unable to create a “absorption field” large enough to absorb more influences , in many cases he fails to see that there is quality beyond the limits that he imposed on himself. This, I understand, will also sound a little prejudiced. That is, who am I to paint this picture? Nobody, check. But have I experienced it? Ui… too many times. But, in a way, I can accept being told that our tastes grow with us and with our experiences, because it is so.

But this is part of a specific case that made me ponder how much I was, or was not, also a little prejudiced in terms of music. Portuguese music is, in all its musical lines, in all its sound realities, superb. From one genre to another, passing through 2564658589 others, there is quality around, as they say. I, who even consider myself quite eclectic and do not carry such guilty pleasures, decided to give a chance to a national project that I have been avoiding for years and years, and even today I do not understand the reason for this: PAUS. In the world of Heavy Metal we end up going after the musicians who please us whenever they create a new project or a new band, mainly because we know that quality is guaranteed. Now, why the same thing didn’t happen here, I don’t know. The Vicious Five, Riding Pânico and If Lucy Fell, 3 of the national projects / bands that I most appreciate and that have more quality / had / I don't even know. Fábio Jevelim, Hélio Morais, Joaquim Albergaria and Makoto Yagyu. Damn the dudes! From Post / Hardcore / Screamo Something by If Lucy Fell, to Rock n 'Roll classy, ​​energetic and flirtatious with Punk, and always elegant, by The Vicious Five, to Post / Rock Instrumental by Riding Pânico, this trio of bands, with their past creations, they “occupied” hours and hours of my days. From the old Hard Club to the 25th of April Stage, from the basement of the Escola Superior de Bragança to the Bar Central, also in Bragança, each of these concerts brought a little more admiration for the work of these 4 musicians.

Now, the reason for having arrived so late “at the party”, I believe that I will never know it. And from here, as already said, the idea of ​​musical prejudice was born. Was he running away from the preconceived idea, by me, of their sound? That was absurd, I say. But maybe… will this Music work like that feeling of “I don't know you but I don't like you”? maybe it’s not that far. And, if we think like that, a lot of good music will pass us by, as was the case. I found myself running a large part of PAUS 'discography, with pleasure, discovering details that I never imagined I would like. It is funny to see how a person grows and becomes more tolerant of realities that, at times, he took as “nefarious” ahahah from the 15 year old kid who didn’t accept clean voices in the Black Metal he heard, to an older kid who intersperses PAUS with Joy Division and Bathory. That is, ladies and gentlemen, similar to pizza with pineapples: a mix of camandro! But this mix is ​​good, it is dynamic, and this diversification is life, it is energy! The pizza… not really. It is listening to Capicua and accompanying the chorus, and then immediately embarking on a journey through the 90s to the sound of any Norwegian band that loves Satan. It is ... strange trip this. Downhill or something.

 And where do these PAUS, in my opinion, manage to win me over? It's a fresh sound ... with just over a decade (go, Danny) in which percussion is, without a doubt, the queen. Two batteries - hey, Melvins - Hélio and Quim, face to face, with strength and groove, with presence and setting the pace that does not deviate an inch from the goal. That bass from Mr. Makoto - Cedric Bixler-Zavala da tuga - filling the spaces, creating that layer of weight, leaning on the batteries, or the batteries in this one. It turns out to be a collaborative effort. The keys, which create delicate, groovy, dark, floating atmospheres, all done by Fábio Jevelim. Sometimes it is music to dance, sometimes it is to fly. I prefer the ones that make me fly, since dancing is not my scene, babes. But is it still funny - or shameful? - that it took a decade to pay attention to a group of musicians who had previously created so much music that I still cherish today, just because I think PAUS would never be “my cup of tea”. Sad. Next step? Linda Martini, maybe. Anyway, guilty pleasures are not my thing.