Whales don’t Fly, mas sabem criar Música boa para cacete

Quantas vezes já aqui mencionei Bragança?! De certeza que não foram as bastantes. No campo das Artes a realidade foi muito pobre por largos anos. Os Sound Advice “encerram actividades” e vejo-me, no que à Música local se refere, órfão. Saltemos anos para o futuro, e vejo surgir, inesperadamente, projectos associados ao metal extremo – Black Metal neste caso. Não era um, dois, ou três... eram quatro. Caramba! Durante anos tivemos zero (Errie Litanies e Mental KO há muito que tinham seguido outros rumos), e de repente, sem que tivesse à espera, surgem quatro. Mas sobre estes falaremos mais tarde. Pouco depois, não me perguntem datas, por favor, descubro um quarteto de nome Raiva Rosa. Pop, Rock, um som bastante agradável, algum travo dos anos 90. Agora sim, algo começa a despoletar.

Esta terá sido a ordem pela qual cheguei aos que me trazem cá hoje: Whales don’t Fly. Recordo que dei por eles em 2018, creio não estar errado. Mas basta ir ver a 1.ª entrevista que os rapazes deram, e descobrimos o dia exacto. Foi interessante, foi, e se há coisa de que me orgulho é de fazer por apoiar, dentro das minhas imensas limitações, aquilo que se faz na capital de Trás-os-Montes, capital do Real Norte. Obviamente que o som criado pela banda tem que me agradar! A máximo dos metaleiros portugueses dos anos 80 era: é nacional? Apoio. Amigos... gosto, apoio. Mas retomemos caminho. Tive a oportunidade de ouvir algumas destas malhas – eram estas? – num espaço pequeno, repleto de tudo e mais alguma coisa ahahah um gajo vai sempre a medo porque já esperas aquela questão “então, que achaste?”, e tens medo que seja mauzinho, e tenhas que mentir. Mas reparem: não menti, gostei, achei que realmente era algo que não se ouvia em Portugal já há bastante, se bem que não sei bem onde os “engavetar”. Conhecendo este pessoal, sabendo que são músicos, não pessoal que um dia pegou na guitarra e siga criar uma banda – e todo o meu respeito a esse pessoal, não me entendam mal – sendo que têm noções do processo de criação musical, sabendo quais as influências de cada um, é imensamente interessante ouvir o resultado final.

Sou um privilegiado. Tenho connects em spots VIP, e hoje chegou-me a promo do álbum de estreia. Picar o ponto, tratar dos emails, relatórios, ver uns casos, yadda yadda... press play. Ok, interessante. Ler a press release, perceber, realmente, de onde nasce este conceito, esboçar aquele sorriso que tem, por trás, a bela da ideia “c@br@es dos garotos, que fizestes?!”, percebem?! É muito engraçado que há temas que, na sua essência, nos transportam para esse Oceano Dourado. Seja pela melodia, seja a tua mente a criar essa imagem, porque és um Ser que vive do poder da sugestão, seja pelo que raio for, mas consegues vislumbrar algo. A Música é isto, é esta capacidade de provocar emoções e “pintar” paisagens e cenários.

Já estava bastante familiarizado com o primeiro single – “Mountain Peak” – e no dia em que foi postado o 2.º (“A Journey’s End”), que depressa foi retirado, percebi que a minha intuição de gajo que nem ferrinhos toca, mas que tem noção da dificuldade destes, estava certa! Esta porra vai ser bomba... e foi... e é! Mas que temos afinal nas mãos?! Temos Rock Progressivo, temos algum Stoner, temos reminiscências de Mastodon, notamos que este pessoal gosta de Floyd, ainda que não tenhamos aqui Floyd no sentido literal, atenção! Opeth, há Opeth. “Dream Walker” é aquele Spacy Rock... que se passa da tola e te dá um chapadão nas trombas! Bô! As teclas, as teclas meus senhores. Ainda não fui apresentado ao jovens por trás das mesmas, mas se houve algo que veio engrandecer o som da banda, foi este senhor. Este jovem, desculpa. Temos algum Thrash na “Man and the Pilgrim”, e muito mais e muita identidade, acima de tudo identidade.

A prestação vocal do Rafael é muito, muito boa. O rapaz até sabe cantar, ah?! Sim, e sabe grunhir, o necessário para que se crie uma simbiose entre ambas as personagens encarnadas. Mas não só. O trabalho de guitarra, e a forma como este e o Jorge "batalham" entre si, dá uma dinâmica tremenda às músicas. Não só sabe cantar, como também sabe tocar... que combo ahahah O Jorge na guitarra, espalha as influências por cada um dos temas, o que é soberbo! Não roubam algo a outros, nem deixam de ser quem são. Outro dia escrevi o mesmo acerca de Benthik Zone, duo de Black Extraterrestrial Metal, do Porto: as influências sabemos quais são, conseguimos sentir que A e B estão em cada um daqueles temas, percebemos como chegámos lá, mas continuam a ser os Benthik Zone. Aqui temos o mesmo. O César é um baterista do caraças! Recordo que falámos do ter Groove, e da importância de tal, independentemente do género musical que se toque. E o César tem Groove, tem uma força que se entende na forma como a percurssão nos ataca, nos tomba! O baixo é audível, meus senhores. Ok, nem sempre, mas é audível, e como é audível ahahah o Zé tem uma forma interessante, na minha opinião, de se lançar às músicas: felizmente não deixa que lhe façam o que os Metallica fizeram ao Jason. Estou aqui, estou presente! Há Groove, há consistência, há aquele som cheio. As teclas, e as minhas desculpas ao jovem por não o nomear – o mesmo que se acuse – vieram engrandecer o som da banda (isso já tinha sido dito, pff), arrastando-a para contornos ainda mais progressivos. Tio Cid is proud, mates.

O curioso disto tudo é que me tenho recordado bastante da conversa, curta, que tive com os pais do Rafael aquando daquela entrevista, em que me perguntam se via futuro para a banda. Eu, que percebo zero de Música, fiquei sem saber que dizer, claro! Como posso avaliar a qualidade de A ou B, sem saber que raio se passa?! É tudo uma questão de emoção, dirão uns. Terei que concordar, em certa medida. E talvez seja esta a melhor forma de analisar a Arte, não sendo um Artista.

Estou, neste preciso momento, na “The Golden Sea” e nos seus 11 minutos e 40 segundos. Um daqueles épicos que se estica, e estica, e estica, e... isso. Mas na verdade não estica. Não é que que gajos são mesmo bons?! As variações, o facto de ser tudo menos linear, a porra das teclas, puto! O saberem exactamente quando grunhir, quando berrar, quando cantar, quando acelerar, abrandar, cortar, retomar. Pá, isto é pessoal com os seus 20 e tal, caramba! A maturidade destes rapazes é tanta. E deixaram o Zé ser ouvido, o que é um ponto a favor ahahah há um saber direccionar a raiva e a agressividade sem cair em clichés desnecessários e mais que batidos. As melodias estão onde deveriam estar. Aquilo que ouvi em 2018 (ou terá sido 2019?), e aquilo que ouço hoje... 10000 anos depois entre Bragança e Mafra.

Esta crítica correrá sempre o risco de ser movida a emoção. É Bragança, e essa relação quase umbilical é omnipresente; o facto de gostar genuinamente deste pessoal (desculpa, teclista... pagas cerveja) pode pesar na escolha das palavras, mas garanto-vos que não, que essa emoção é posta de lado quando se chega a este momento, não é? Eu creio que sim, eu fi-lo sem essa condicionante. E assim chegamos ao fim. Isto vai rodar muitas mais vezes, deve ser inclusive um excelente amigo para o ginásio e para correr... gonna give it a go.

Whales don't Fly Bandcamp

Atenção que isto foi escrito sem posterior revisão, pelo que qualquer gralha, ou inconsistência, é culpa do momento.

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